quinta-feira, 28 de junho de 2007

Clube dos poetas

Aqui também se fala de poesia.
Aqui degustam-se as palavras que se escapam dos dedos,
nos momentos da criação.
Aqui mergulha-se nas penas inspiradas dos vates de todos os tempos.
Aqui cabem todas as palavras, escritas com amor
Cochat Osório é o primeiro convidado

Paisagem

No fundo
além da fortaleza sonhadora,
das acácias em flor,
da cidade espalhada em colinas,
da cascata de vidros nas encostas,
do vôo disparado daquele patos
e do calor de tua mão,
no fundo,
feito paisagem indiferente,
o ruído do mar.
Monótono, constante, distraído,
marcando-me o compasso ao pensamento.

E o pôr-de-sol, as nuvens cor de fogo,
a cinza abrasada, um dongo na baía,
a fortaleza debruçada, além,
como quem espreita para além do mar...
Toda a beleza cálida me fere,
só porque o mar, monótono, indiferente,
repete aquelas frases, cáusticas, brutais,
que eu trouxe no meu peito com vinte anos
os versos de combate,
o meu olhar altivo,
as horas de visão
e os passos muito incertos e tão fortes
que eu sentia no rumo do futuro.

Há uma sombra no céu
e uma névoa nos meus olhos.
As janelas apagam-se em penumbra,
o dongo atravessou a água mansa
e a tua mão aquece a minha mão.
E a tua mão aquece a minha mão.
Crispas os dedos, sentes esta angústia:
a beleza completa-se com dor.

Ao fundo, o mar,
o mar que nos embala e nos conforta, o mar...
Ó meu amor, e diz, eu ouço, ele diz,
que a alma não está gasta,
a ânsia não está morta,
se os olhos são capazes de chorar!

Cochat - Osório (No reino de Caliban II - antologia panorâmica de poesia africana de expressão portuguesa)

domingo, 24 de junho de 2007

Memórias de um búzio

Os búzios têm uma capacidade especial que lhes permite armazenar sons do meio ambiente onde se encontram e os mais sonhadores gostam de os encostar ao ouvido, em busca de sonoridades de mar, ventos marinhos e às vezes, sons marinhos que quase deixam adivinhar os gritos das gaivotas. Se quisermos acreditar, os búzios contam histórias de mar, contos do oceano profundo, às vezes epopeias de esperança.
Até bem pouco tempo tive dois búzios pequenos, que apanhei na praia de Sesimbra, durante um dos muitos passeios de fim de tarde com o meu avô. Com aquela generosidade que tão bem caracteriza os homens do mar, o meu avô convidou-me para procurarmos conchinhas e búzios, que também iriam servir de brinquedos. Entrámos um velho búzio, pequeno, vazio, de formas arredondadas, abandonado no areal, coberto de salmoura, restos de algas e muitos grãos de areia colados à casca. Naquela altura, mal me cabia na mão pequena e rechonchuda... Fiquei imensamente feliz com o precioso achado e achei que ele precisava de companhia.
Quando chegámos a casa, fomos lavá-lo e depois deixá-mo-lo em água e detergente para ficar mais limpinho. Fomos mudando a água e mais tarde, esfreguei-o com uma pequena escova. Aos poucos lá fui descobrindo as cores de origem. É um búzio muito bonito que, com o andar dos tempos acabou por caber na minha mão. E ficou mais bonito ainda quando o presenteei com uma camada de verniz.
A maior magia daquele búzio passava pela diversidade dos sons; mar amigo e mar cansado, mar preguiçoso e mar zangado, mar e vento ou simples brisa... Nem é preciso dizer quantas vezes o encostei ao ouvido. Aquele búzio acompanhou-me durante muitos anos, sempre com lugar de destaque na minha casa. Aquele búzio sobreviveu à curiosidade infantil, à falta de jeito para agarrar objectos, mudanças de casa... Aquele búzio viveu comigo quase quarenta anos e foi a muda testemunha das minhas alegrias e dos momentos menos simpáticos. Recentemente ofereci-o porque sim. Foi uma das prendas que mais gostei de oferecer, porque naquela, estava "algo" de mim. Mais tarde, recebi uma mensagem no meu telemóvel: "Ouve-se o mar dentro do teu/meu búzio"! Fiquei ainda mais feliz! O velho búzio gostava da nova família e para comprovar continuava a reproduzir aquelas sonoridades marinhas que ajudam a sonhar.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

"Via sacra" de beijinhos


Dá um beijinho a esta senhora, que é muito amiga da avó!”. E pronto, lá começava a “via sacra”... Tantas amigas que a avó Adelaide Manso tinha; perdi a conta aos beijinhos que dei e recebi no percurso “casa da avó” - “Loja do sr. Pedro”, “casa da avó” – mercado, “casa da avó” – “qualquer ponto da vila de Sesimbra”. Às vezes, pensava - ingenuamente - que toda a gente tinha saído à rua, só para me obrigar a dar beijinhos...
A recompensa vinha com as idas à praia, os passeios pela marginal e pela praia com o avô Zézinho, os saborosos gelados da Luisa e do Manel Agostinho, as histórias que os pescadores contavam na “loja de companha”, os jantares em família, o sorriso de satisfação lá em casa quando os barcos "voltavam do mar", com o nível da água muito próximo da amurada, sinal promissor de faina próspera.
Desses tempos guardo ainda alguns búzios e conchinhas que encontrei perdidos na praia durante os passeios de fim de tarde com o avô Zézinho. Desses tempos guardo na memória a vista impagável da velhinha casa dos meus avós no Bairro Infante D. Henrique; dali via toda a baía de Sesimbra, o porto de abrigo e até parte da praia. Nessas alturas sentia que aquele mar também era um bocadinho meu e quando estava a adormecer, achava que as ondas me cantavam canções de embalar.
De vez em quando, passo pelo bairro só para olhar para as ruas, para as casas; continua tudo quase igual. Só faltam os personagens que noutros tempos ajudaram a colorir a minha infância. Há um momento repetido muitas vezes, que me apetece partilhar; os passeios de burro que me faziam sentir uma grande cavaleira. Algumas das vezes, já com a bóia a postos, porque a praia era a próxima etapa.
Nos dias de hoje, quando passeio pelas ruas da vila, já não corro o risco de esgotar a reserva de beijinhos com aquelas "senhoras velhinhas "muito amigas da avó", as filhas e as sobrinhas, as vizinhas e amigas das vizinhas... A vida ajudou - no entanto - a preservar algumas destas memórias de bem querer. Numa idade mais adulta fui descobrindo que alguns dos rostos sesimbrenses com quem me cruzava por motivos profissionais, já tinham lugar cativo nas memórias da minha infância. Constatei isso mesmo da primeira vez que entrei na "Loja do senhor Pedro" transformada em pronto a comer e mais tarde, numa conversa informal com a Conceição Morais, na altura presidente da Junta de Freguesia de Santiago. Por isso, é muito natural que lhe deixe aqui um beijinho e um outro à Marizé, também pela simpatia e porque... adivinhem!

quarta-feira, 20 de junho de 2007

Gente de (muito) ouro

Existem momentos que só valem a pena serem falados uma vez. Também porque ainda fazem doer. Existem outros - momentos - que merecem atenção e abordagem constantes. É por isso que recordo com imenso carinho os companheiros com quem partilhei o meu dia a dia nos últimos nove anos, um pequeno grande universo de seres de muita luz, que a força dos sentimentos transformou numa família ligada pelos laços da fraternidade.
São gente que coabita num mundo aberto a quem vier por bem. Gente que dá a mão, gente ocupada que desafia a pressa num abraço apressado e também apertado, gente que aceita partilhar solidariamente os dias de sol e os momentos cinzentos, gente que veste a camisola do profissionalismo e da humildade, mesmo quando a recompensa mal compensa. Gente que chora e gente que ri, gente que fala com os olhos e com as mãos, pedaços de sol, de mar e de céu que estão também no meu futuro.
São Sofias de muita ternura, Tiagos e Gonçalos pardalitos de simpatia, Vanessas de grande paciência, Jacintos que ficam bem em qualquer jarra, Zés também garridos de cores e muito boa disposição, Ritas muito doces, ventoinhas, de ferro muito maleavel, de sardas, sempre à pressa, Robinson's de muito samba, Fecas com o céu no olhar, muitos Carlos inspirados e um Jorge mestre da sabedoria, são Oscares da mais fina academia do Humor, são Paulos que "matam" de mimo, " guerreiros" transformados em soldados de bondade, Leonel's de muita força, Antónios e Linas de grande generosidade, Paulinhos de simpatia, Joãos de muita ternura, Nunos ousados e generosos que se esgueiram quais enguias, carecas ou a caminhar para esse estado de nudez capilar, Mários de grande coerência, Rubens de grande animação e simpatia.
São também Franciscos amigozito's, Pilares pingentes, galegas e choronas, Florbelas de um jardim onde também cabem golfinhos e Mateus, são Martas muito animadas e são Fátimas capitais de universos distintos, a Magda e o João Pedro mestres do traço firme, e um Pedro carismático, "Luises" que escrevem e que às vezes torram a paciência, Ruis de muito controle e informatica, um impagavel Heeeeeelder sempre atencioso, um Miguel de muita ternura, um Gigi de sorriso lindo, a Milocas e a Lu rainhas do bom tempero e muita doçura, uma Filomena apressada e uma Branca transparente de discrição.
São ainda Claudio um princepezinho, Ana a eterna miss e rainha da simpatia, Valentina fortaleza de amabilidade, uma Raquel a crescer, uma Dama que pode ser de ouros, de copas ou paus ou espadas, um Daniel generoso e nascido para brilhar, uma Dora gigante de paciência e boa disposição, quartetos de muitos instrumentos e vozes afinadas, um saxofone que brilha e de vez em quando um Jaime de grande talento musical, poetas de imagens que realizam o outro lado das histórias, um Hugo de muita criatividade e uma Picas tão sensivel, uma Cris de voz e coração sonoros, Sónias e Eunices de grande generosidade, uma Isabel com muito soninho e sentimentos bem despertos, uma Ester de pena inspirada, uma Vera de grande disponibilidade e afecto, e uma Paula ligada por grandes correias a pensamentos muito à frente... acredito que esqueci alguém... são tantos e são tão bons; são a melhor equipa do mundo.

Elogio da partida

Já todos nós sentimos um dia vontade de partir mesmo sabendo que deixamos um pedaço de nós. E partimos, porque sim. Porque as outras razões já não interessam e embora a viagem não tenha sido planeada assim, os outros motivos não merecem sequer comentários. Falta-lhes consistência, falta-lhes coerência, falta-lhes todos os pedaços da razão. São faltas que a capacidade de perdoar dificilmente desculpa, são coisas que o melhor é deixar nas mãos do tempo que de certeza as vai direccionar para o caixote do esquecimento profundo.
As partidas também podem ser libertadoras. As partidas também podem ser um caminho de esperança. As partidas também nos permitem descobrir novos jardins onde podemos criar as sementes de esperança que tanta gente bonita plantou no nosso coração. Sementes regadas com afecto, adubadas com a generosidade que aprendemos todos os dias também no abraço que se dá quase a correr, também quando aceitamos a mão que se estende e quando também estendemos a nossa mão.
Nas partidas pouco planeadas o melhor é não levar muita bagagem. Três ou quatro cd's armanezam bem os ficheiros do computador. Enquanto isso, o coração já foi arrumado para criar mais espaço para as emoções. E são tantas e são tão boas. São o reverso da medalha cinzenta da partida; são o motor da coragem que quase se esvai na força do abraço que apetece eternizar, são a força que também impede e às vezes impele a descoberta das cataratas de águas limpas escondidas em cada olhar.
As partidas também são dores que só nós podemos curar. Porque os afectos são para sempre, todos os que amamos estão para sempre no nosso coração, pintam-nos a alma todos os dias com as mais bonitas cores do arco iris. As partidas também são desafios à capacidade de amar, perdoar, sobreviver. As partidas mostram sempre novos caminhos de liberdade, fraternidade, solidariedade e dignidade que vale a pena trilhar. As partidas também dão coragem para fazer coisas novas que dão tanto sentido à vida.
Vale a pena partir quando a bagagem é composta por afectos que cabem confortavelmente no coração e os cd's se arrumam facilmente na pequena mochila.

terça-feira, 19 de junho de 2007

Diário de bordo


Navego, por esta altura, numa noite de muitos mares desconhecidos. Lá longe, faróis amigos guiam-me na escuridão e ajudam-me a não encalhar nos recifes. Este barco que me leva - acredito - a um porto promissor tem o leme à solta. Por isso, deixa-se ir, um pouco à bolina, sabendo que a terra prometida está ali, ali ao fundo, por detrás de um outro cabo de boas esperanças que a força dos ventos - também - de afecto me ajuda a dobrar.
Esta é uma viagem quase solitária. Tenho tudo o que preciso para chegar a bom porto. A bússola da vontade, as velas da esperança, os motores das solidariedade, os salva vidas do respeito, as bóias da dignidade. E o barco, é da melhor construção, feito com as melhores madeiras dos bosques da paz, calafetado com pensamentos de amor...
Tenho, à minha espera, uma baía com muitos barcos de pesca, também próspera de luz, afectos e outras riquezas. Até lá chegar, a minha alma alimenta-se de cenários de mar e ternura. A fome de escrita é naturalmente saciada na magia das palavras que me escapam dos dedos, a sede de chegar é acalmada por um desejo (maior) de missão cumprida. Da cabine de comando, onde sou mestre e tripulação, comandante e pescador, vigia e condutor, avisto espadartes solitários cavalgando imponentes ondas de bem querer, também golfinhos brincalhões que me oferecem sorrisos de liberdade, cardumes de peixes que a lua transformou em rios de prata... O canto nostálgico da gaivota lembra um fado de saudade e consigo ouvir os gemidos da guitarra; o chapão (na água) do alcatraz que quase milagrosamente avistou um peixe no oceano profundo, desperta-me para outras melodias.
Andam por aqui umas ondas mais impacientes, facilmente ultrapassadas pelas outras correntezas de harmonia. Umas e outras são verdes; verde escuro da pressa, verde azulado da esperança, verde clarinho da tolerância. Umas e outras deixam-me correr atrás do sonho, deixam-me acreditar também, permitem-me despertar para o sonho (mais alto) de alcançar o meu porto seguro.
Nesta viagem tenho ainda uma canção de embalar cantada pelos sons do mar no silêncio da noite, um céu de muitas estrelas brilhantes e uma lua de prata que quero partilhar, e um pedaço de sol feito amizade, feito o ouro que guardo ciosamente no baú dos afectos.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Scotex folha dupla

O meu gosto por fazer partidas é um dos poucos indicios do meu humor e naquela manhã eu estava de facto muito bem disposta e com uma vontade enorme de brincar; a "vítima" foi a minha colega Maria João, a quem chamavamos também e muito carinhosamente, Batatinha.
Procurei um determinado site - que a iria deixar furiosa - e com um clique, partilhei o som algo arrepiante com toda a redacção. Para melhor saborear o meu triunfo ofereci à minha colega um dos meus melhores sorrisos e num gesto bem infantil, deitei a lingua de fora.
A coisa estava a correr bem até que o nosso chefe fez valer o mau feitio que o caracterizava e "docemente" recomendou que se acabasse com a sinfonia.
Alguns minutos depois o chefe saiu e voltei à carga, triunfante! As tais sonoridades arrepiantes fizeram-se ouvir de novo para grande desgosto da "Batatinha", que ainda me ameaçou: "Olha, o Jorge disse que nunca mais queria ouvir isso. Se ele entra, estás... feita!".
"Por isso mesmo, vou aproveitar cada ausência dele", respondi.
"Ai é? Então cada vez que ele sair, eu vou atrás dele e pronto" - afirmou.
"Olha lá, e quando o senhor for à casa de banho, também vais atrás dele? - perguntei.
"Quando ele for à casa de banho, vou atrás dele e até lhe limpo o rabinho com scotex folha dupla!", concluiu.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Quinzinho, minha "p..."


Numa das intermináveis madrugadas (fiz tantas na Rádio Azul) em que o mundo - obviamente - estava a dormir, fui surpreendida pelo matraquear do telex. Aproximei-me e mais espantada fiquei: "Estive a ouvir o teu noticiário. Vejo que estás bem melhor da afonia"... O remetente nada me dizia, desconhecia-lhe por completo a existência mas, ainda assim, resolvi responder: "Deve haver confusão. Eu não estive afónica", escrevi e enviei. A resposta veio no imediato: "Tens muita graça. Ontem "dizias" estar afónica. Também já não te lembras dos telexes que me mandaste na noite passada, das coisas que escreveste... certo?".
Os poucos vestígios de sono eclipsaram-se. Completamente desperta, escrevi: "Na noite passada, estava em minha casa, a dormir". A troca de telexes ainda se prolongou por mais uns minutos, o rapaz continuava a dizer que tinha sido eu e para fundamentar, reenviou-me o tal telex. Pasmei e finalmente percebi. Para ele, não havia dúvidas; na véspera, eu tinha-lhe enviado prosas - um bocadinho - tórridas. Ou melhor, alguém tinha enviado e assinado o meu nome. E o melhor de tudo; quem lhe tinha mandado aquelas mensagens - que naturalmente o tinham entusiasmado - também lhe tinha dito estar afónica! Imagine-se porquê!
Horas mais tarde, depois de ter passado o serviço à minha colega, "atirei-lhe" com a história do telex, acusando-a de ser a autora da brincadeira. O espanto dela não me convencia e estava quase a chamar-lhe um nome menos próprio, até que me apercebi que o meu amigo Quinzinho estava na redacção, deliciado, a ouvir a conversa. E, inocentemente, ainda lhe disse: "Já viste a m... que fizeram? E o gajo está todo convencido que fui eu. Que m...".
Continuei a barafustar e quando voltei a olhar para o Quinzinho, reparei que a custo tentava disfarçar o riso, não resisti... Brindei-o com o insulto destinado à nossa companheira de trabalho!

terça-feira, 12 de junho de 2007

A força das palavras


Aos onze anos, finalmente, percebi o conteúdo de um discurso político. As palavras povo e liberdade, ditas por Odete Santos, eram tão simples, tão bonitas e entravam facilmente, também, no coração. Gostei tanto do que ouvi, que só uma imensa timidez me impediu de dar um abraço à oradora.
Por esses anos, em que Portugal saciava a fome de liberdade, em que os espectáculos de “Canto Livre” se multiplicavam nas colectividades e nas escolas, tive a oportunidade de ouvir varias vezes Odete Santos falar daqueles novos conceitos que tinham passado a fazer parte do nosso quotidiano. Conceitos e valores oferecidos pela jovem democracia, que Portugal saboreava no banquete da liberdade. Também por essa altura, ouvi Odete Santos dizer poesia e novamente fiquei rendida, também ao talento.
Anos mais tarde, tive oportunidade de a conhecer pessoalmente (aposto que nem sonha o quanto se tornou importante na formação da minha consciência política); a bondade e a simpatia da – até há bem pouco tempo – deputada, proporcionaram uma relação de admiração, respeito e também de amizade.
Trinta e poucos anos depois de ter ouvido aquela primeira intervenção politica que tanto me sensibilizou, a simplicidade e o registo pausado e emocionado de Odete Santos continuam a surpreender-me e a comover-me. As palavras ganham força, as palavras lavam a alma, as palavras são o pão da esperança; as palavras são doces, amargas, contundentes, apaixonadas, sonhadoras, são tudo o que esta – grande - mulher quiser.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

O melhor exemplo

Escrevo estas linhas a pensar num homem bom, naturalmente generoso, sábio, que há vinte e um anos apadrinhou a minha vida profissional. Dei os primeiros passos na rádio (Rádio Azul, em Setúbal) pela mão segura do jornalista Jorge Simões. Anos mais tarde entrei no mundo da televisão, também bem apoiada no braço forte deste grande profissional.
Com ele reaprendo todos os dias a importância do empenho, do rigor e da isenção e até as palavras mais convenientes a dizer na hora do aperto (e aplicadinha, repito com bastante agilidade). Com ele reaprendo também diariamente valores seguros para a vida como a dimensão do respeito e da amizade.
O meu “pai profissional” é a candeia sempre acesa que me ilumina mesmo na noite mais escura. Quando faço algum disparate, sou “docemente” criticada e chamada à razão. O Jorge é um homem de princípios, isento, cheio de bom senso. Os sábios ensinamentos que me tem transmitido estão gravados na memória e no coração com letras de ouro.
Há muitos anos deu-me uma lição preciosa: “Esta sala onde trabalhamos chama-se redacção porque é aqui que escrevemos, que pomos à prova a nossa independência e a nossa criatividade. No dia em que deixares que alguém te dite uma notícia, muda o letreiro desta sala e chama-lhe ditado”.
É por isso que me orgulho de ter trabalhado numa redacção que nunca mudou de nome; num espaço feito catedral pelos bons exemplos do Jorge, a quem tenho o privilégio de chamar também Amigo.
Escrevi grande parte desta prosa há dois anos; o Jorge Simões leu e pronunciou-se. Agora, quando reler estas linhas, vai certamente barafustar comigo e resmungar qualquer coisa do género: "Eu não sou assim tão perfeito. Exageraste outra vez!". Por isso e em nome do rigor, acrescento às inumeras qualidades do meu Amigo, um imenso "mau feitio" na mesma proporção da bondade, talento e criatividade, que fazem dele um ser humano maravilhoso.
O respeito, a admiração e o afecto que tenho por este homem, grande de coração e verticalidade, dão-me diariamente força e coragem para lhe seguir os passos. Porque existem valores mais altos que vale a pena cultivar.

As Rotas do Sonho


Este blog é um espaço de partilha e afectos. Partilha do gosto pela escrita, partilha dos afectos que se vão criando ao longo da vida. Gostar de escrever vem dos tempos da infância, essa época mágica também da novidade das letras que dizem coisas, contam histórias e falam de sonhos. É esse o "poder" da escrita. Permite ainda preservar as memórias, dizer o que vai na alma, reconhecer que vale a pena sonhar.
Este espaço - que espero partilhar com outros amigos que também gostam de escrever - é um tubo de ensaio para todas as experiências de dar sentido às palavras e com elas ajudar a pintar o sonho e a própria vida.
"Pelo sonho é que vamos" é o título de um livro de Sebastião da Gama. O poema que lhe dá mote chama-se "Sonho" e saúda quem entra neste blog. Por gostar tanto da obra deste poeta - descoberto na adolescência curiosamente numa escola que passou a dar pelo nome de Sebastão de Gama - escolhi-o para "padrinho" desta, muito séria, aventura blogueira.
Aqui são "postadas" histórias, sonhos, opiniões, poesias e outros estados de alma. E que tudo ajude à doce tentação de dizer de quem gosto e o contrário também.